Há muitos que aprendem a ser
duros demais consigo mesmo pela cultura, por ensinamentos que formam o caráter
que com o tempo passam a ser um grande “inimigo”
a ser enfrentado. Alguns mudam de lado por uma questão de sobrevivência. Outros padecem por não se curvarem diante daquilo que não acreditam. Mas são poucos os que se libertam dessas algemas de circunstâncias.
Trazemos sobre nossos ombros uma carga
de culpabilidade por decisões mal tomadas, mesmo assumindo o risco calculado.
Quem foi atingido por uma “bala perdida”, diz-se que estava no
lugar errado, na hora errada. “A vítima do assalto morreu porque reagiu”. Aos
poucos vamos construindo a ideia de que nesse mundo todos são santos, nós é que
somos os demônios. Se o mal está acontecendo do lado de fora, você é o culpado;
quem atirou é que está certo, o
atingido é que provocou.
Se quer viver certo num mundo errado, a culpa é
sua. Se não consegue sucesso pela dignidade, a culpa é sua. Se busca qualidade
e deseja viver acima da média e não consegue espaço, “a culpa é sua”. Se confiou e se frustrou, é porque não confiou
direito. A culpa é sua. Se você pediu e não recebeu, é porque não teve fé
suficiente. A culpa é sua. É sempre uma desculpa, uma explicação. É um mundo em que para sobreviver, é preciso
dançar conforme a música, e há tantos que nem aprenderam a dançar! De quem é a
culpa?
Há muitos que se sentem o tempo
inteiro no lugar errado, na hora errada. As “balas perdidas” sempre os
alcançam. Se não abrem mão de suas convicções para não juntar-se aos
que agem em desconformidade com seus princípios, dispõe-se a pagar o preço da
irrealização sob outro aspecto da vida. Mas há os que se submetem à ideia do
“matar para não morrer.” Se assim todos fazem,
matar passa a ser um legítimo meio de sobrevivência. “Corromper” e ser “corrompido” é prática comum na escalada social. Aos
poucos, os valores morais são substituídos por uma necessidade “inventada”, da
qual todos tornam-se dependentes.
Quer se dar bem? Tem que ser como
um deles. Não se importe com os outros. Não dá para jogar limpo num terreno
enlameado. Está sofrendo porque não é aceito? A culpa é sua!
É assim mesmo? É isso que
precisamos fazer?
Até que ponto a mediocridade e a
imbecilidade terá espaço? Ao nivelarmos a sociedade por baixo, pelos mau
exemplos, pela falta de opção ou pela barreira criada para as opções não se
revelarem, passamos a admitir e aceitar
a construção de um outro modelo de sociedade, uma outra visão de mundo.
“O mundo não gira em torno de
você” – dizem os adaptados ao mundo de maneira crítica. Na realidade, pensar em
você mesmo é adequar-se ao “mundo” para obter o que se impõe como o único meio
de sobrevivência. A ação contrária torna-se um “peso” quando deparar-se com
essa realidade interfere no ideal de vida, a ponto de levar o indivíduo a
questionar-se: “Será que todo mundo está certo e só eu estou errado?”
O “bom ânimo” é sempre
desconstruído, recebe um “banho de água fria” quando o ideal de vida esbarra-se
numa realidade da qual não participamos. É como se sentir um peixe fora d’água.
Nem sempre esse comportamento pode ser interpretado como arrogância ou orgulho,
mas pode explicar o caráter do indivíduo. Nesse contexto, o viver desajustado
provoca sentimentos de incapacidade.
Aquele que escolheu viver segundo
a ordem da honestidade, justiça, honra, amor ao próximo, e sobre esses pilares
construiu seu caráter, dificilmente se sentirá ajustado onde para sobreviver é
preciso se metamorfosear. Dificilmente se manterá calado, quando discursos e
práticas contrariarem os princípios que defende. Por isso, dificilmente será
aceito. “Morreu porque quis.” A culpa é sua. Será?
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