Foi chocante quando um jovem
replicou a ideia de que a Lei de Deus revela o caráter de Deus. O ponto de partida foi o fato de que Deus não
se enquadraria nas determinações da lei que Ele instituiu. A lei de Deus não
faz efeito em Deus, porque o seu caráter é justo, puro, santo e perfeito,
diante do retrato que a própria lei mostra a nosso próprio respeito. Nenhum
mandamento de Deus se aplica a Ele, mas a nós. Portanto, Deus está acima de sua
lei, por isso seu julgamento não considera apenas o que está determinado na lei
que Ele apresentou à Moisés no Monte Sinai, que foi uma forma direta e didática
de controlar e regular as relações entre as pessoas, sem nenhuma perspectiva de
mudança de caráter do ser humano. As bênçãos decorrentes da observância da lei é um fato que se resume unicamente pela obediência. Mas isso não torna o indivíduo espiritualmente mais elevado ou privilegiado diante de Deus, pois só a obediência sem o conhecimento da essência de sua observância, pode resumir-se apenas num comportamento condicionado.
A lei não nos leva à Cristo. A condenação da lei é a morte. O
que nos leva à Cristo é o seu chamado. Foi
exatamente isso que Ele tentou fazer os fariseus entenderem. O cumprimento dos
ensinamentos de Cristo nos leva a cumprir toda a lei, não o contrário. “Tudo o
que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós também a eles, porque esta é a
lei e os profetas”. (Mateus 7:12). Nisto se resume o amor a Deus e ao próximo. A lei sem
Cristo é morte eterna. E a lei, com Cristo, perde seu sentido real de
condenação.
Por outro lado, o fato de Jesus ter cumprido a lei não
significa que essa lei instituída por Deus fosse extinta. A morte de Cristo foi
a chancela da graça. A lei nos mostra o que somos diante da graça, o nosso
caráter pecador, e o que a morte de Cristo significou diante da condenação da
lei, porém, não nos retirou a condição de pecadores, e por consequência,
enquanto houver transgressor, a lei terá vigor. Podemos considerar a lei como o “caminho da graça”, é antecedente, um trecho percorrido. A caminhada da fé e da justificação em Cristo, nos afasta cada vez mais da condenação da lei, e
quem foi alcançado pela graça superou a lei como um meio de se chegar à
salvação.
A condenação da lei, portanto, é aplicada aos que vivem
praticando o pecado, logo, estão sob o jugo da lei. A Bíblia fala sobre os
praticantes da iniquidade, os que vivem segundo a carne e suas cobiças. E quem
está em Cristo é nova criatura e não anda segundo a carne, mas segundo o
espírito.
Se não houvesse lei alguma, cada um viveria segundo seu
entendimento e suas conveniências, tratando apenas de seus interesses. Imagine
se não houvesse a lei que regula a propriedade e que todos os “sem terra”
resolvessem invadir e cercar seu território? Imagine se no trânsito todos dirigissem
do jeito que achasse melhor?
Certamente aqueles que escapassem das reações e dos acidentes
poderiam aprender com a própria experiência de vida. E essa experiência
acabaria por abalizar sua conduta. As leis são criadas por causa do caráter do
ser humano que se contrapõe aos direitos dos outros. Elas vão surgindo de
acordo com a necessidade.
A lei de Deus foi instituída para mostrar a condição do
homem, não apenas com base em suas possibilidades e inclinações para o pecado,
segundo sua presciência, mas para garantir proteção aos que tivessem
acesso à ela e a condenação para os transgressores, mesmo por desconhecê-la. A
consequência do erro ocorre mesmo sem o conhecimento do transgressor de suas
regras. Qual seria a consequência para aquele que adulterasse contra a mulher
do próximo? No mínimo um crime passional como reação ao ato imoral. Mesmo que
não houvesse a lei de trânsito, aquele que dirigisse desordenadamente sofreria
acidente de percurso. Por isso a essência da lei não se resume apenas em suas
determinações. Aqueles que pecam sem lei, também perecem. Esse é o grave problema
do legalismo. O legalista está mais preocupado com as letras, com o que a lei
determina; até que ponto pode errar para que não incorra nos rigores previstos
da lei; onde está a brecha?
Esse é um dos pontos cruciais cujo entendimento vem apenas
com a maturidade espiritual, pois, é mais fácil estar adequado a uma
determinação legal, o que a lei prevê, apenas, sem nenhum entendimento de sua
essência que ultrapassa comportamentos convencionais. Jesus foi categórico quando disse aos
fariseus que aquele que odiasse a seu irmão era o mesmo que cometesse um
assassinato contra ele. Aquele que
desejasse a mulher do próximo (não precisava necessariamente cometer o
adultério físico), já teria cometido o ato de adultério.
Tornamo-nos legalistas quando desejamos nos autoafirmar pelo
cumprimento da lei, de nos acharmos superiores sobre os transgressores. Ora,
que mérito há em cumprir a lei? Se
cumprimos a lei, fazemos apenas o que ela determina e não há privilégio nessa
ação. É preciso ir além. “Se a vossa
justiça não exceder a dos escribas e fariseus, jamais verão a Deus.”(Mateus 5)
Conseguimos ver a Deus pela manifestação de seu amor, como
Cristo ensinou: “Se lhe pedirem a túnica, dê-lhe também a capa; se lhe pedirem para
caminhar uma milha, caminhe duas”. A
justiça dos fariseus era fria, sem compaixão, mas eles estavam cumprindo seu papel
ao fazer o que a lei rezava. Quem os poderia condenar? (Mateus 5:40). Quando de maneira autoafirmativa e exacerbadamente exaltamos a lei, ao mesmo tempo estamos exaltando a maldição que ela representa ao apontar o nosso estado pecaminoso, esquecendo-nos de que é a cruz que nos justifica e que é o sangue de Cristo que nos purifica de todo o pecado.
O entendimento do que Cristo revelou torna-se grande lição
para avaliarmos a nossa conduta diante do que é a lei e do que é a graça. A lei
jamais perdeu seu valor, pois ainda não superamos a condição pecadora, porém do
mesmo modo, a Graça de Cristo age paralelamente como uma válvula de escape que
a lei não oferece: “Porque o salário do pecado é a morte” Mas a vida eterna é o
dom gratuito de Deus. Se estamos debaixo
da Graça de Cristo, superamos a condenação da lei enquanto permanecermos sob
seus cuidados.
Pelo caráter da lei somos condenados. Pelo caráter de Deus, o amor revelado por sua graça seremos salvos. A lei terá seu
vigor até o fim, até que a morte e o pecado sejam exterminados para sempre, mas se estivermos em Cristo, a lei não terá
poder condenatório sobre nós.
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