Da última
vez que o vi, ele estava bêbado, como sempre. Eu passava em frente ao boteco em
que ele conversava à porta com alguns amigos. Sempre que me via, não deixava de
me chamar pelo nome, com voz grave e arranhada pelo cigarro. Ele me contava que
também fora radialista e que era filho de um famoso empresário do Rio de
Janeiro de uma rede do ramo de pneus, amortecedores e suspensão de veículos,
mas saiu cedo de casa. Segundo ele, para não depender do pai.
Há quem busque refúgio nos botecos. E no copo um amigo. |
De mãos
dadas com meu filho, parei para falar com ele por alguns minutos naquela tarde.
Ele estava ali, local onde frequentava
todos os dias. Se alguém quisesse encontrá-lo, era no botequim que ele estava.
Aliás, botequim parecia sua casa e os amigos de copo, seus familiares. Um
jovem. Inteligente, pensador, que gostava da justiça, tinha talento para
pintura com desenhos de traços exóticos incríveis e escultura. Ele tinha muito respeito quando ouvia falar
de Deus.
Foi
naquele dia que eu voltei a dizer-lhe: - Você é de Deus. Deus quer mudar a sua
vida. Ele riu. Não foi um riso de sarcasmo. Percebi que era um riso como que ser
de Deus fosse para ele algo bom para ser verdade, quando prosseguiu: -Eu? de
Deus? eu sou um cachaceiro, Elias. Um cachaceiro – enfatizou, como que
decretando o seu presente como o futuro.
Meu
filho, prestando atenção, interveio e reafirmou ao jovem: -Se todo mundo é de
Deus, você também é de Deus. Não é papai? -Sim, filho, concordei. O rapaz que fitava os olhos em mim
quando eu falava, abaixou o olhar para o meu menino de 5 anos, e, emocionado,
silenciou-se.
Foi a última vez que vi o Fábio. Soube pelos meus familiares no Rio de Janeiro que este jovem morreu recentemente. Uma morte triste, em casa, sozinho. Alcoolizado. Ele não morava com familiares e pouco falava de família. Era um solitário que buscava nos bares, conversar, contar suas histórias... os sóbrios que passavam pelo local, mesmo conhecendo aquele rapaz, dificilmente paravam para falar com ele. As vezes, tinha umas conversas "chatas", mas quem o percebia via nele uma alma pedindo por socorro.
Soube que dias antes de morrer, ele começou a
frequentar a igreja. Lá chegava bêbado, mas nunca foi impedido, mesmo "perturbando" em algum momento
a pregação do pastor, que com muito carinho, descia do púlpito para acalmá-lo
com a mão em seu ombro, que o deixava em
silêncio por alguns momentos.
Fábio estava
indo à igreja. Parecia buscar socorro e dizia que queria Deus, mas estava com
medo. Dizia que estava com muito medo.
Foi nesse intervalo em que frequentava a igreja que ele morreu. Uma coisa é confortante para nós. Deus é o justo juiz, porque conhece o coração humano, muito além do nosso olhar.
Hoje, dei
a notícia para o meu filho. – Lembra daquele
moço que nós conversamos com ele em que
você disse que ele era de Deus, quando fomos lá na casa da vovó? – Lembro,
respondeu meu filho, dizendo: -Jesus não vai ressuscitar os mortos, pai? – Sim,
filho, respondi. E meu filho diz sorrindo - Se ele não sabia disso, ele vai ter
uma surpresa quando Jesus voltar. Acho que ele vai gostar.
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