quarta-feira, 30 de julho de 2014

A FRAUDE DA NOVA CLASSE MÉDIA



As aparências enganam, diz o provérbio popular. Isso se aplica a muitas áreas da vida. Há muitos troncos de árvores bonitos por fora, mas podres por dentro, que se revelam apenas quando vem a tempestade.  
A sobrinha, precisando de dinheiro emprestado, procurou a tia que mora do outro lado da rua: “Tia, me empresta 100 reais?” Não é uma mulher de grande poder aquisitivo, mas conseguiu com sacrifício e planejamento financeiro, terminar sua casa, uma das mais bonitas do bairro; conseguiu comprar um carro zero quilômetro. Essa é a aparência que leva os vizinhos a pensarem que ela tem altos ganhos. Na verdade ela é diarista, e sempre teve em mente o sonho de uma vida mais confortável, coisa que seus pais não conseguiram. No fim dos anos 1970, sofreu a amargura do que é perder a casa própria. O pai vendeu uma casa para comprar outra, e a inflação galopante desvalorizou o dinheiro que não foi suficiente para adquirir o novo imóvel para dar conforto aos filhos. Ao chegar à casa da tia e pedir emprestado, ela responde: “Não tenho esse dinheiro, minha filha; o que eu tinha eu gastei fazendo os freios do carro.”

Lembro-me de um samba enredo que ouvia sem querer quando criança, brincando no quintal com o vizinho ao lado ouvindo sua vitrola. Não me lembro de quem cantava e qual era o nome do samba, mas o intérprete, já nos anos 80, desejava “o leite sem água; a gasolina barata.” Em outro trecho dizia que no passado “a vovó guardava a poupança no colchão” como quem dissesse que muitos anos antes, ainda se podia guardar dinheiro e ele não perdia o seu valor de compra, antes mesmo do mercado financeiro dominar a economia.  Do samba para cá, o leite continua com água, e a gasolina continua cara; a população de baixa renda tem conta em banco, mas não tem dinheiro.
Se hoje as pessoas conseguem adquirir bens materiais é por fruto do trabalho e planejamento financeiro, que hoje se torna possível pelo controle inflacionário dos últimos 20 anos. Isso não é dado estatístico. É a realidade. Mas não é com facilidade. O cidadão ainda vive a insegurança financeira, tendo que trabalhar pelo menos 150 dias do ano só para pagar impostos. Quando está envolvido com a prestação da casa, reza para ninguém na família ficar doente. A coisa na verdade pode ter melhorado em parte para a população considerada miserável que não tinha o que comer, e agora tem, por subsídio do governo. Mas nada além disso. Não há maiores consequências positivas, pelo contrário: é cada vez maior o número de pessoas assistidas pelos programas considerados sociais do governo Federal. Isso é um forte sinal de que a vida da população não melhorou da maneira como alardeia a publicidade oficial. A saída de muitos da condição de miserabilidade foi apenas pelo fato de ter o que comer, isso é, sem dúvida, o básico; a base da pirâmide. Não justifica o auto aplauso do governo.  

Uma coisa é aumento do rendimento do trabalhador; outra coisa é seu planejamento para trabalhar com os recursos que possui, contando com o papel do governo de criar empregos e manter a inflação sob  controle. Isso não quer dizer que a vida do povo está melhorando, pois, o que se vê é que as aquisições materiais são restritas. É possível que o cidadão compre um carro zero quilômetro, mas seu endividamento o impossibilita de fazer outra coisa enquanto paga as prestações.  Mesmo que hoje se diz que o salário mínimo é o maior de todos os tempos, se você comparar o seu poder de compra, não dá para fazer as compras básicas de supermercado, com o que era possível há 20 anos para uma família de 4 pessoas. O salário aumenta, mas não aumenta o seu poder de compra. Não se pode considerar como um resultado positivo na vida do assalariado, apesar de o governo utilizar os números para provar que hoje o salário é maior que o que foi pago anos atrás. Mas o que se deve observar não é a quantidade do dinheiro, mas a quantidade que o mesmo dinheiro é capaz de comprar no decorrer do tempo.
Esses dias, o ex-presidente Lula tentando exaltar seu governo e cutucar “as elites”, da qual ele hoje faz parte, - a quem atribui as mazelas do país – disse que “eles” ficam com ódio porque “a empregada doméstica está usando o mesmo perfume da patroa e frequenta a mesma festa”. O que não se fala é sobre o esforço ou planejamento que essa empregada faz para adquirir coisas ao mesmo nível de sua patroa. Não se faz  análise, por exemplo, de sua capacidade de endividamento e seu poder aquisitivo em relação ao da patroa, nem de outras agregações de valores, sejam eles materiais ou educacionais que, tem um peso tremendo para a realização na vida de uma pessoa, pois o que conta em questões de crescimento pessoal, não se limita apenas ao consumo e no poder de compra de  produtos de marca, mas deve se estender às condições de trabalho, educação, o nível de escolaridade, acesso à saúde de qualidade, entre outros, que são deveres do Estado que deve cumprir com suas obrigações, cujos elementos são fatores para a ascendência na escala social, muito mais que a possibilidade de viajar de avião e comer mais carne de frango. 
O Brasil já falou de fome, que afetava  aqueles que não possuíam condições para adquirir alimentos e viviam à margem da desnutrição; também tratou-se da segurança alimentar, que é a possibilidade de a pessoa comprar o alimento que quiser, consumir o que escolher, não importa em que dia do mês, porque possui recursos para fazer o que precisa. É poder comprar o iogurte do filho, sem precisar esperar chegar o dia do pagamento do salário. "O pobre anda de avião", como alardeia o Lula, mas não diz que a inadimplência do consumidor bate recorde. 


Isso acontece em outras áreas também. Uma coisa é o cidadão se planejar para adquirir objetos, assumir compromissos com uma prestação; outra coisa é ter dinheiro para outras necessidades, mesmo gastando em outras áreas.

Aparentemente está tudo bem, mas a casa em que mora não está quitada; o carro que comprou não está pago, e o IPVA atrasado. Certamente pesquisa como esta não é feita com a população, para, pontualmente saber o que é realidade, e o que é número numa escala estatística. No fundo, vivemos sob o alarde político, de matérias fantasiosas de que a vida das pessoas melhorou. O que existe, de fato, é a vontade individual e o interesse em mudar de vida e, não é de hoje, que o brasileiro vive dessa maneira. Se há ricos no Brasil, trata-se de pessoas que lutaram e trabalharam para esse fim. O povo trabalha e o governo erra em usurpar o suor do trabalhador em discursos que não dizem a verdade. É só observar a sua vida, a do seu vizinho; dos moradores do seu bairro. O que mudou? Não passa da superfície. Porque ainda não vivemos em um país desenvolvido, e que ainda se ilude pela aparência, mas vive numa crise de identidade, apesar do endividamento com as clínicas de cirurgias plásticas. 


-Tia, me dá um carrinho de controle remoto no meu aniversário?
-Puxa vida, deixa para o próximo? É que estou pagando a prestação da prótese de silicone.


É possível que aquela pessoa que se esmera no trabalho para pagar a prestação do carro novo, ainda “conte moedinhas” para comprar o pão. 

sábado, 26 de julho de 2014

ERRANDO CERTINHO!


Tudo o que somos instruídos a fazer na vida requer que seja feito "certinho". É assim que a humanidade vem sendo dirigida. Dirigida? Mas  todos  não tem vontade própria e direito de escolher o que fazer? Na teoria isso é uma realidade, mas não se cumpre seguramente na prática. Algumas escolhas são feitas por falta de alternativas, uma via de escape que não ofereça prejuízo. "Ou pegar ou largar" pode ser confortável para quem está oferecendo, nem sempre para quem está sendo oferecido. O risco é de quem precisa, não de maneira proporcional a quem está em vantagem. 
De todas as maneiras somos sugestionados, até mesmo quando são criadas justificativas que  deem suporte para as decisões tomadas as quais referendam algumas atitudes, principalmente quando se faz parte de algum sistema organizado. Há muitos que erram, mas tem que errar “certinho”, não  podem pisar fora da faixa, assim como os que são sugeridos e ensinados a fazer algo considerado moral e correto, que seja feito correto, onde um simples tropeço põe tudo a perder. É assim dos dois lados: do lado de lá, e do lado de cá da porta. Não importa de que lado alguém esteja, a exigência é cumprir bem seu papel.

Certa vez um funcionário de uma importante organização foi demitido e, antes que saísse, um dos diretores da empresa disse: “Espero que você deixe as portas abertas.” O que isso pode nos fazer entender?
Por um lado, uma aparente supremacia, como se esse funcionário não conseguisse sobreviver do lado de fora. Por outro lado, pode nos fazer supor que existiu algo, não tão agradável da parte de quem estava se despedindo, que pudesse o levar a reivindicar o que poderia ser seu direito. 

“Um dia você pode bater na minha porta de novo” – por isso, não tente fazer nada que venha fechar as portas!
“Deixar portas abertas” significaria não denunciar os erros? Não se confrontar com os considerados mais fortes que “aniquilam” os mais fracos por seu poder de domínio e manipulação? Não buscar seus direitos? Quem pode, dita as regras, e nunca foi tão clara a célebre frase: "Manda quem pode, obedece quem tem juízo." Mas obedecer a quê, ou a quem? - Não é de sano juízo a obediência a qualquer ordem, e o adaptar-se a qualquer sistema em nome de uma "harmonia" mascarada. As sensações e sentimentos reprimidos por "ordens" um dia eclodem. Mas para evitar esse tipo de reação extrema, o sistema usa seus recursos de manipulação para arrefecer os ânimos e desviar o foco do que é real. É uma espécie de anestesia que alimenta sonhos, faz nascer supostas esperanças que não acontecem senão por uma ação direta, individual e independente do indivíduo, que é levado a acreditar que não vai conseguir do outro lado da porta. Que sem ajuda, ele não vai longe; que do outro lado é tudo difícil; que ruim aqui, pior lá fora; levando-o a um espírito de constante dependência, submetendo-se a conformidade com o que pode ser mudado pela libertação. 

É cada vez mais difícil manter os valores que aprendemos, num sistema que para dominar sobre os demais, invertem a ordem das coisas. É preciso se submeter a esses modelos amparados por argumentos razoáveis sob ponto de vista da sobrevivência e da satisfação pessoal para sobreviver, e para isso, muitos  acabam  reprogramando sua mente para não se sentirem afetados ao fazer algo que lhes pareça errado. “Matar para não morrer”; “Antes ele do que eu”; “Se parar na minha frente eu atropelo.” E não é raro ouvirmos discursos que levam pessoas a se sentirem confortáveis, mesmo fazendo algo que aprenderam não ser correto.  E, com o passar dos tempos, o que era errado, passa a ser feito  corretamente e de maneira “impecável.” Pessoas são absorvidas de seu poder de percepção de suas reais atitudes, encontrando justificativas pessoais que explicam suas ações, pois assim tem sido ensinadas.
É preciso reaprender a liberdade


O que você é capaz de fazer para manter as portas abertas? Avalie dentro de que portas você está e quais os requisitos precisa cumprir para que elas continuem abertas para você. Nem sempre uma porta aberta significa liberdade. As portas podem estar abertas, mas você desaprendeu a ser livre, sua mente foi reprogramada por sugestões manipuladoras, outras vezes por força de circunstâncias. 
Ao lembrar do episódio da tentação de Jesus, imaginamos que o diabo "abriu as portas" do mundo, oferecendo reinos e posições, sob o cumprimento de um pedido: "Você terá tudo isso, se ajoelhado me adorar." É notório que tudo o que alcançamos na vida é por recompensa. Precisamos cumprir requisitos para obter resultados. Mas de que fonte tem vindo nossa recompensa? A quem ou a que temos nos submetido para cumprir os requisitos em troca dessa recompensa? 
Portas abertas  pode ser escravidão, subserviência e aniquilação da individualidade; da justiça, da verdade; a renegação de valores e a relativização de princípios. Em que portas você tem batido? Onde pretende entrar?  Do lado de dentro, todos precisam cumprir seu papel, direitinho. Até mesmo quando são ensinados a errar, mas tem que errar “certinho.” Politicamente correto. 

sexta-feira, 25 de julho de 2014

SALVANDO RATOS


Quem se importaria com a vida de um rato? Que valor teria esse roedor para as pessoas a não ser o incômodo, a proliferação de doenças, o nojo, entre outros sentimentos de repulsa? É notório que tudo o que aprendemos na vida é, na maioria dos casos para a nossa proteção. Sem conhecimento podemos até conviver com o perigo inocentemente e, talvez por isso, muitas vezes, não somos afetados. A afetação, primeiro ocorre pela percepção e entendimento dos perigos e das ameaças. Sem essa percepção obtida pela informação objetiva, passamos a contar com a experiência subjetiva, pela qual experimentamos realidades e a partir delas formamos nossos conceitos e análises sobre o que os detentores da informação teórica explicam. Essa subjetividade que permeia a experiência pessoal é que leva muitos a se espantarem quando alguma coisa foge do senso comum, por exemplo. Há os que se pasmam quando alguém diz ter uma "barata de estimação." 

A maneira de convivermos com o perigo não diminui a periculosidade real, mas aumenta o nosso senso de proteção. A harmonização da convivência não ocorre simplesmente pela aniquilação ou extirpação daquilo que nos incomoda, mas respeitando os limites pelo entendimento do que somos em relação a esse perigo.

É nesse ponto que muitas vezes começamos a errar. É aprendizado comum de que tudo o que nos incomoda precisa ser eliminado. Talvez pelo entendimento de que a nossa vontade, a nossa segurança e o nosso desejo devem ser resguardados e buscamos respaldo para justificarmos nossa ofensiva.
Vivemos numa sociedade assim. Parece que os “ratos” precisam ser eliminados quando “invadem” o nosso espaço a procura de alguma coisa. Quem se importaria com “ratos?” Mas muitas vezes ignoramos o fato de estarmos pisando em terreno inimigo e consequentemente nos tornamos inimigos também.  
Certa vez ocorreu uma experiência comigo que foge ao senso comum. Eu salvei um rato! O salvei, e o levei para o lugar de onde saiu. Mas, o que ele procurava nos corredores de uma emissora de rádio, quando assustados, alguns colegas e a zeladora munida com uma vassoura corriam para tentar alcançá-lo e dar um fim no animal? Foi no momento em que o bicho encurralado no canto da parede que pedi à colega da limpeza um balde. Cerquei o animal ali, estressado, ofegante. Seus olhos esbugalhados e bigodes trêmulos pela respiração acelerada, totalmente indefeso. E atrás, vozes que diziam: "dá logo um fim nesse bicho nojento!"

Mas em frações de segundos, vendo a imagem sofrida daquele roedor, em minhas mãos, senti dó. Os olhos arregalados olhando para mim como pedindo socorro. A respiração ofegante pela estressante perseguição que sofreu. Foi assim que encurralado para dentro do balde, e sem poder escapar, levei o bicho para a rede de esgoto da rua, soltando-o dentro do ralo à beira do meio fio paralelo à calçada.

Quando tentamos justificar nossas razões para aniquilar,
invertemos os papéis. 


Que serviço estaria eu prestando se eliminasse aquele rato? Seria apenas um rato a menos? Talvez diante  dos  amigos receberia aplausos. Mas  às  custas do sacrifício de um "inseto", que não tem valor algum. Mas observe como estamos vivendo hoje? Não estaríamos buscando ganhar aplausos e condecorações, fazendo coisas sem valor?

Muitas vezes queremos mudar nossa vida e nossa história, eliminando “ratos”, mas de fato, esses ratos precisam apenas estar no lugar deles. Precisamos aprender a avaliar o que é realmente nocivo para a nossa vida. Há coisas que não podemos eliminar, apenas precisamos entender para buscar maneiras de sobreviver pela informação, pelo conhecimento das coisas e o autoconhecimento. Viveremos o bem e o mal de cada dia. Isso é fato. Mas respeitando-nos e respeitando. Se preciso for, fugir da aparência do mal se não podemos lidar com ele sem nos tornarmos presas de suas ações. Não podemos nos livrar da convivência entre o bem e o mal, entre o limpo e o sujo; cada qual tem oportunidades para cumprir seu papel, até que a renovação de todas as coisas ocorra. O mal por si, se  destrói. Nossa intervenção contra o mal de maneira direta e agressiva poderá inverter os papéis e o entendimento de quem somos e o que queremos. O mal não terá fim por mãos humanas.
 

E vi um novo céu, e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe.
E eu, João, vi a santa cidade, a nova Jerusalém, que de Deus descia do céu, adereçada como uma esposa ataviada para o seu marido.E ouvi uma grande voz do céu, que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens, pois com eles habitará, e eles serão o seu povo, e o mesmo Deus estará com eles, e será o seu Deus.
E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas. E o que estava assentado sobre o trono disse: Eis que faço novas todas as coisas. E disse-me: Escreve; porque estas palavras são verdadeiras e fiéis. E disse-me mais: Está cumprido. Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim. A quem quer que tiver sede, de graça lhe darei da fonte da água da vida.”

terça-feira, 22 de julho de 2014

UM NOVO BRASIL



Achei graça de uma recente declaração atribuída ao ex-presidente Lula, de que “eles (quem?) ficam com ódio porque a empregada está usando o mesmo perfume da patroa e frequentando a mesma festa.” É muita mediocridade de um ex-chefe da Nação reduzir a discussão política do país com grandes possibilidades de crescimento e infraestrutura, ao uso de perfume pela empregada, como se fosse o ápice da realização de uma pessoa. Parece que afagar o ego dos “pobres” por discursos triunfalistas, pelo consumo de roupas e calçados de marca, de uma viagem de avião e idas aos shoppings tem funcionado. Sim. Funciona num país em que mais da metade é composta de analfabetos funcionais, sem a menor análise crítica do que lhe ocorre. “O que importa é ter dinheiro para comprar perfume.”



Esses dias fiquei surpreso quando precisei encontrar alguém para limpar um terreno. Era preciso fazer uma roçagem e poda de árvore. Onde encontrar? Perguntei pelas pessoas que antes faziam esse tipo de serviço. A resposta foi: “não está mais fazendo isso” – ele está ganhando o Bolsa Família. Melhoraram de vida? - não sei. O que há de concreto é que alguns andavam de bicicleta velha, e hoje sofrem com carros enguiçados na rua; outros que pediam um "servicinho" para comprar o leite das crianças, e que agora não precisam mais. Melhoraram de vida? Se governantes num país como o Brasil ainda  valorizam a política do arroz com feijão, é provável que não tenham feito a nação sair da base da pirâmide. Até quando?

Pode ser, como diz o Lula, que a empregada use a mesma marca de perfume da patroa, mas não se diz a que duras penas ela conseguiu isso, diferentemente da condição favorável da patroa que poderia comprar quantos perfumes desejasse. É uma discussão rasa. Muito rasa. Aliás, como disse certa vez o saudoso Brizola: "Lula é espuma; não consegue se aprofundar." Uma coisa é alguém conseguir crédito; outra coisa é a capacidade de endividamento. Uma coisa é comprar o mesmo modelo do carro do patrão; outra coisa é pagar seus impostos e manutenção. Pode até fazer uma "graça" jantando em restaurantes de luxo, mas pagar apenas a fatura mínima do cartão de crédito, deixando crescer a "bola de neve". Esse é o Brasil da "nova classe média" iludida pelos discursos oficiais; mergulhada em dívidas e inadimplência. 

Vivemos um Brasil assim, de aparência, de espuma, de superfície. Não tem saúde, mas tem celular para chamar a ambulância. Se ela vai chegar a tempo, não importa. Não tem educação, mas para quê, se a funkeira é pensadora e vira celebridade ovacionada por iletrados manipulados em nosso país?
 

Não sei se é um fato generalizado ou local, mas vivi época em que não faltava oferta de mão de obra. Alguém que batia em seu portão oferecendo algum tipo de trabalho. Aqueles meninos que precisavam ajudar em casa, gritavam para a minha mãe:

“Moça, tem algum servicinho aí para mim? Quer limpar o seu quintal?” – não eram crianças de rua, eram meninos, filhos de vizinhos que estudavam em escolas públicas, mas sabiam o valor das coisas. Onde eles estão? Subiram no degrau da escala social? Ou continuam surfando na espuma? Mas conheci muitos desses que se formaram e conseguiram ser alguém na vida, porque tinham sonhos. Pessoas honestas e decentes que aprenderam que a vida não é fácil; "nada cai do céu". 
As dificuldades podem levar as pessoas a buscarem um caminho para uma nova realidade. Foi o que muitos fizeram. De vez em quando o ex-presidente Lula aparece em público alfinetando as "elites." Ora, o que é elite para o Lula? É alguém ter alcançado com o trabalho pessoal e por mérito próprio alguma ascenção na vida? Esses são, de fato, os não manipuláveis pelos discursos populistas e paternalistas. Para eles isso não cola. A grande maioria dos ricos de nosso país cresceram na vida por seus próprios méritos, trabalhando duro, economizando; com projetos de vida e sonhos.

Mas parece que o patrocínio do governo tem levado a uma certa acomodação para aqueles que não conseguem sentir a fundo a necessidade, pelo menos no que diz respeito à comida. 

Ali ao lado, a mulher sem marido (ele morreu de ataque cardíaco por coma alcoólico em frente a um boteco) e com 7 filhos. A filha mais nova com 15 anos já é mãe; o menino mais velho vive na rua soltando pipa com os pequenininhos aos pés dele, descalços, mal vestidos, com remelas nos olhos e um pedaço de pão francês sem manteiga, mordido quase à metade. A mãe vociferando palavrões de baixo nível com os filhos, ameaçando-os com um pedaço de pau para saírem da rua, sem nenhum preparo para cuidar da educação de berço. A vizinhança diz que ela fuma e bebe e as roupas (boas roupas) e calçados que ganha para os filhos, vende em bazares e gasta o dinheiro com bebida.Ela também é assistida pelo programa social Bolsa Família do governo federal.

Esses dificilmente mudarão de vida, exatamente por falta de estímulo, de programas que funcionem de maneira geral que atendam, principalmente, não a necessidade por comida, pois essa é a parte mais cômoda para um governo, mas trabalhar as estruturas sociais, no que se refere ao acesso à educação, ao trabalho; estabelecer nos bairros núcleos de atendimento psicossocial que atendam a famílias fragmentadas e desestruturadas nesses aspectos. Como será o futuro dos filhos dessa família? É uma incógnita. Pode ser que a dificuldade os desperte para um "estalo" de que precisam mudar. Mas são crianças, dependentes de alguém que os encaminhe na vida. Sem uma boa referência na família até que se torne pessoas livres para decidir o seu próprio futuro, pode ter perdido muitos anos de busca.
Sem trabalho não há fruto. Nem futuro.

O que estimula alguém a buscar algo melhor na vida, não é a fartura, é a escassez; não é a bonança, é a tormenta. Isso muita gente vive e que chega ao ponto de entender que precisa fazer algo por si mesmo e por sua família.

Conheci gente que trabalhava apenas em troca de cachaça. O que uma pessoa dessa fará ao receber ajuda do governo? 

Finalmente encontrei uma pessoa. Um homem, 41 anos. Se desdobra em trabalhos braçais como pedreiro autônomo e consegue espaço na agenda para limpar terrenos, mas com cortador de grama elétrico. Ele me procurou montado em uma moto, nova, com ferramentas que carregava num bagageiro. Ao tratar o serviço, fomos caminhando juntos para o local onde faria o trabalho. E no caminho falou de sua vida:

"Meu pai era muito durão. Um dia ele disse para mim que eu não seria nada na vida; mas ouvi aquilo como um desafio. Ele disse que eu não dava para nada e eu respondi a ele dizendo que eu ia conseguir sim. Hoje eu tenho a minha casa, eu trabalho muito. Já comprei carro zero e tenho essa moto aí; quando eu termino o meu trabalho durante o dia, eu estudo a noite; vou para a escola terminar o ensino médio, e quero entrar para a faculdade, com o meu suor. Hoje o meu pai se orgulha de mim. A oportunidade existe, a gente tem que aprender a correr atrás para mudar as coisas."



É notório que a educação, o estudo escolar, em que crianças e jovens deparam-se com outra realidade e passam a entender a realidade do mundo e do que é preciso fazer para alcançar coisas melhores na vida, principalmente quando os professores são pessoas experientes, bem preparadas e orientadas para instruir esses jovens nesses temas extracurriculares. Os professores de minha época falavam sobre política na sala de aula, mesmo fugindo um pouco do conteúdo programático. Eles conversavam com os alunos; perguntavam como tinha sido o seu dia; aconselhavam os que diziam ter problemas. Era um ambiente amistoso, e isso não era ordem da escola, era do professor que passava suas experiências de luta e dizia: “Eu cheguei aqui hoje, porque estudei muito; vocês podem chegar aonde quiserem se estudarem.”  



Mas o que querem fazer do nosso Brasil? Os professores se tornaram refém; não podem sair do programa; tem que cumprir agendas em outras escolas, entre outras atividades paralelas para se sustentar. O governo não pretende ser “O pai” dos pobres, mas o tutor. E sob sua tutela, esse povo acaba se tornando refém por causa de sua necessidade e dependência. Assim esse circulo vicioso continua. 

No fim dos anos 80, conversando com o dono de uma farmácia que fazia anúncio no alto falante em que eu trabalhava, fomos interrompidos por um garoto:

-Moço, me dá um dinheiro para eu comprar um pão? 
O Tião da farmácia parou a conversa comigo e olhando para o menino disse:

-Você quer lavar o meu carro? Se você lavar o meu carro você vai poder comprar até mais que um pão. Deixa eu te dizer uma coisa: dinheiro é fruto do trabalho. Se você trabalhar, você tem dinheiro. Eu só tenho dinheiro porque trabalho. 

O menino saiu de perto de nós sem graça. 

Tião continuou e disse: "Está vendo? A gente precisa ensinar que o dinheiro é fruto do trabalho; essas crianças precisam entender isso."


Mas no novo Brasil é assim: aquele que conseguiu comprar um carro novo, não consegue pagar o IPVA e tem dificuldade para abastecer; tem um carro na garagem, aparelhos de celulares, perfumes e roupas de marca, mas é uma espuma, é coisa de superfície, pois lhes falta dinheiro e recursos para remediar situações imprevistas. É uma “elevação” de status superficial, sem nenhuma orientação sobre economia e finanças. O que eleva uma pessoa não são as coisas que adquire, mas a agregação de valores em si mesmo, que não vem por outras vias que não a educação, a boa formação, o desenvolvimento do senso crítico e analítico da realidade em que vive.

Há muitos hoje, respondendo ao pai como aquele menino:



-Filho, você prefere um bombom ou uma caixa?

-Uma caixa, pai. Claro que eu prefiro uma caixa.



Desapontado ao receber a caixa de bombons, percebeu que ela estava vazia.